A Rosa de Hiroshima, de Vinícius de Moraes (interpretação e significado)


Rebeca Fuks
Revisão por Rebeca Fuks
Doutora em Estudos da Cultura

A Rosa de Hiroshima é um poema escrito pelo cantor e compositor Vinicius de Moraes. Recebeu esse nome como um protesto sobre as explosões de bombas atômicas ocorridas na cidade de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, durante a Segunda Guerra Mundial.

Criada em 1946, a composição foi primeiro publicada no livro Antologia Poética. Mais tarde, em 1973, os versos foram musicados e ganharam corpo na voz do grupo Secos e Molhados.

Conheça abaixo o poema completo, o significado dos versos e os detalhes sobre a publicação.

Poema completo A Rosa de Hiroshima

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.

Significado de A Rosa de Hiroshima

O poema de Vinicius de Moraes foi criado a partir da tragédia da bomba atômica ocorrida no final da Segunda Guerra Mundial, no Japão.

O ano era 1945 e o golpe de misericórdia dado pelos Estados Unidos - o envio de bombas atômicas com proporções inimagináveis - afetou de modo dramático a região.

Para além dos civis assassinados na ocasião, mais de 120 mil pessoas sobreviveram ao estouro da bomba de Hiroshima, ficando com cicatrizes e sequelas permanentes.

A Rosa de Hiroshima tornou-se um grande protesto, primeiro em forma de poema e mais tarde em forma de música. Os versos abordam as consequências da guerra, o desastre que as bombas atômicas - apelidadas pelos norte-americanos de Fat Man e Little Boy - fizeram em Hiroshima e Nagasaki.

Vinicius de Moraes atuou durante muitos anos como diplomata a serviço do Governo Brasileiro e também por esse motivo esteve muito interessado nos conflitos internacionais.

Vejamos com atenção os quatro primeiros versos do poema:

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas

O início do poema mostra os efeitos da radioatividade nas vítimas civis que foram atingidas. As crianças, alheias ao conflito de duas grandes nações, tornaram-se nos versos de Vinicius de Moraes "mudas telepáticas". As "meninas cegas inexatas" parecem fazer menção às consequências da radioatividade nas gerações futuras.

Os versos a seguir tratam das migrações feitas após a queda da bomba. As cidades atingidas, ambientalmente e economicamente devastadas, precisaram ser evacuadas devido ao alto risco de contaminação:

Pensem nas mulheres
Rotas alteradas

É só no nono, no décimo e no décimo primeiro verso que a causa de todo o mal é revelada:

Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima

A bomba é comparada com uma rosa porque, quando explodiu, resultou na semelhante imagem de uma rosa a desabrochar. Uma rosa costuma estar relacionada com a beleza, no entanto, a rosa de Hiroshima remete para as horríveis consequências deixadas pela guerra.

Logo a seguir vemos a imagem da rosa se contrapor com o rastro que é deixado pela bomba. "A rosa hereditária / A rosa radioativa" exibem o contraste entre a flor, o auge de um vegetal crescido em um ambiente saudável, e a destruição causada pelo homem.

O poema de Vinicius de Moraes fala das gerações afetadas pela guerra e pelo rastro de sofrimento e desespero deixado nas gerações posteriores. "A rosa com cirrose" faz referência à doença, ao fumo, uma antirrosa sem qualquer beleza, "sem cor sem perfume".

Imagem da bomba atômica, que serve como tema para a composição de Vinicius de Moraes.
Imagem da bomba atômica, que serve como tema para a composição de Vinicius de Moraes.

Música A Rosa de Hiroshima

O poema de Vinicius de Moraes foi adaptado para música. A canção foi lançada em 1973 no disco de estreia do grupo Secos e Molhados. A sua composição melódica é da autoria de Gerson Conrad, integrante do referido conjunto, cuja formação inicial também incluía João Ricardo e Ney Matogrosso.

A parceria entre Gerson Conrad e Vinicius de Moraes foi imortalizada pela voz de Ney Matogrosso e lançada durante a Ditadura no Brasil.

A Rosa de Hiroshima acabou sendo uma das canções mais escutadas nas rádios brasileiras em 1973 e a revista Rolling Stone brasileira a classificou em 69º lugar entre as 100 Maiores Músicas Brasileiras.

Sobre a publicação do poema

A Rosa de Hiroshima foi publicada na Antologia poética, lançada pela editora A Noite, no Rio de Janeiro, durante o ano de 1954. Nessa época, Vinicius de Moraes trabalhava como diplomata na França.

O livro foi organizado pelo próprio autor com o objetivo de reunir 21 anos de publicações. Amigos ilustres, como Manuel Bandeira, ajudaram a organizar a edição. Rubem Braga assinou a orelha da primeira edição.

Frontispício da edição Antologia poética, lançada em 1954, que trazia o poema A Rosa de Hiroshima.
Frontispício da edição Antologia poética, lançada em 1954, que trazia o poema A Rosa de Hiroshima.

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Rebeca Fuks
Revisão por Rebeca Fuks
Formada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010), mestre em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013) e doutora em Estudos de Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pela Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (2018).