Anáfora
A anáfora é uma figura de linguagem caracterizada pela repetição de uma ou mais palavras no início de versos, frases ou orações. Essa técnica tem como principal objetivo criar um efeito de ênfase, além de facilitar a memorização e a compreensão da mensagem.
A repetição cria uma cadência rítmica que pode tornar o texto mais agradável e envolvente, aproximando-o da musicalidade característica da poesia.
A anáfora pertencente ao grupo das figuras de construção ou sintaxe. O recurso estilístico estabelece uma conexão clara entre as partes do discurso, facilitando a progressão das ideias.
Além da figura de linguagem, anáfora também pode ser um recurso de coesão que consiste na retomada de um termo previamente citado, substituído por outra palavra ou expressão.
Exemplos de Anáfora
A anáfora é um recurso estilístico muito utilizado em diversos gêneros literários, como peças de teatro, canções, discursos, slogans publicitários e, especialmente, em poemas. Apresentamos a seguir 10 exemplos de anáforas utilizadas em textos famosos.
1. Discurso de Martin Luther King, Jr. em Washington, D.C., em 28 de agosto de 1963:
"[..] Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença — nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais.
Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade.
Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.[...]"
2. Eclesiastes 3:1-15
"Existe um tempo próprio para tudo e há uma época para cada coisa debaixo do céu.
Há um tempo para nascer e um tempo para morrer;
um tempo para plantar e um tempo para colher o que se semeou;
um tempo para matar e um tempo para curar as feridas;
um tempo para destruir e um tempo para reconstruir;
um tempo para chorar e um tempo para rir;
um tempo para lamentar e um tempo para dançar de alegria;
um tempo para espalhar pedras e um tempo para as juntar;
um tempo para abraçar e um tempo para afastar quem se chega a nós;
um tempo para andar à procura e um tempo para perder;
um tempo para armazenar e um tempo para distribuir;
um tempo para rasgar e um tempo para coser;
um tempo para estar calado e um tempo para falar;
um tempo para amar e um tempo para odiar;
um tempo para a guerra e um tempo para a paz."
3. "Águas de março", canção de Tom Jobim
"É o pau, é a pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é um laço, é o anzol
É peroba no campo, é o nó da madeira
Caingá candeia, é o matita-pereira [...]"
4. "Auto da Barca do Inferno", peça teatral de Gil Vicente:
"À barca, à barca segura,
barca bem guarnecida,
à barca, à barca da vida!
Senhores que trabalhais
pola vida transitória,
memória, por Deus, memória
deste temeroso cais!
À barca, à barca, mortais.
Barca bem guarnecida,
à barca, à barca da vida! [...]
5. Discurso de Winston Churchill, primeiro-ministro inglês, em 4 de Junho de 1940, durante a Segunda Guerra Mundial:
"[...] Muito embora grandes extensões da Europa e antigos e famosos Estados tenham caído, ou possam cair nos punhos da Gestapo e de todo o odioso aparato do domínio nazista, nós não devemos enfraquecer ou fracassar. Continuaremos até ao fim. Lutaremos na França, nos mares e oceanos; lutaremos com confiança crescente e força crescente no ar. Defenderemos a nossa ilha custe o que custar; lutaremos nas praias, nos locais de desembarque, nos campos, nas ruas e nas colinas. Nunca nos renderemos [...]"
6. "À procura da poesia", poema de Carlos Drummond de Andrade:
"[...] Não dramatizes, não invoques, não indagues.
Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável. [...]"
7. "Consolação", canção de Vinícius de Moraes e Baden Powell:
"Se não tivesse o amor
Se não tivesse essa dor
E se não tivesse o sofrer
E se não tivesse o chorar
Melhor era tudo se acabar [...]"
8. "A vida só é possível reinventada", poema de Cecília Meirelles:
"[...] Não te encontro, não te alcanço…
Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada."
9. "Canção do exílio", poema de Gonçalves Dias:
"[...] Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá."
10. "Sermão de Santo Antônio aos Peixes", de Padre Antônio Vieira:
"Oh que excesso tão afrontoso e tão indigno de um elemento tão puro, tão claro e tão cristalino como o da água, espelho natural não só da terra, senão do mesmo céu! [...] E que neste mesmo elemento se crie, se conserve e se exercite com tanto dano do bem público um monstro tão dissimulado, tão fingido, tão astuto, tão enganoso e tão conhecidamente traidor!"
Diferença entre Anáfora e Catáfora (Linguística)
A anáfora vai além de simplesmente repetir palavras ou expressões. Na Linguística, é um recurso de coesão textual em que um termo já mencionado (o "antecedente") é retomado por meio de outra palavra ou expressão, evitando repetições no texto.
Exemplo:
Alexandre queria almoçar feijão (termo antecedente). Comeu-o (termo referente) com gosto.
A catáfora, por sua vez, ocorre quando uma palavra ou uma frase prepara uma informação a ser apresentada no texto. Consiste, portanto, numa espécie de antecipação de algo que ainda será dito.
Exemplo:
Só te digo isso: não fale mais da minha vida.
Neste exemplo, percebemos que o pronome "isso" antecipa a informação que só será apresentada a seguir, "não fale mais da minha vida".
Tipos de Anáfora
Na Linguística, temos dois tipos de anáfora: pronominal e conceitual.
A anáfora pronominal é composta por um pronome anafórico, que retoma um substantivo mencionado anteriormente, substituindo-o de acordo com seu número e gênero.
Exemplos:
- Pedro apareceu na televisão. Ele foi entrevistado por uma jornalista do jornal das oito.
- O carro está estacionado na rua. Leve-o para a garagem.
A anáfora conceitual ocorre quando a retomada do termo antecedente quebra as regras gramaticais, alterando seu gênero ou número. Neste caso, o leitor compreende a retomada a partir de elementos linguísticos e extralinguísticos (contexto).
Exemplos:
- A câmara aprovou o projeto de lei. Eles votaram em segredo.
- Dê-me um garfo. Eles estão no armário.
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