Cultura Africana

Gessica Borges
Revisão por Gessica Borges
Mestre em Estudos Africanos

Cultura africana é o conjunto de conhecimentos, crenças, valores e costumes dos povos que habitam o continente africano, que possui cerca de 1,1 bilhão de pessoas. Como a África é imensa e diversa, o mais correto é falar não de uma única cultura, mas de “culturas africanas”, no plural.

Só para se ter uma ideia de tamanha diversidade cultural, existem na África cerca de 490 etnias diferentes, muitas delas convivendo dentro de um mesmo país. Só na África do Sul, há 11 idiomas e diversos grupos étnicos, dentre os quais os zulus, os xhosas, os pedis, os sotos e os tswanas.

Tradições africanas

Religião

Apesar da colonização, a cultura tradicional africana persistiu. Na esfera religiosa, o avanço do cristianismo, sobretudo após a colonização, não foi capaz de eliminar os sistemas de crença tradicionais.

Cerca de 20% de toda população africana se declara adepta de alguma religião tradicional, como a dos iorubá, grupo étnico que ocupa parte dos territórios da Nigéria, Benin e Togo. Foi a religião do povo iorubá, com sua adoração aos orixás, que deu origem ao candomblé no Brasil.

Muitos costumes ou tradições, mesmo entre indivíduos que se declaram cristãos ou muçulmanos, vêm dessas crenças tradicionais. Podemos destacar os seguintes:

  • Respeito pela ancestralidade e crença de que eles podem intervir no mundo.
  • Manipulação de forças do bem e do mal através do acesso a divindades (como os orixás).
  • Práticas rituais, como sacrifícios e orações, e uso de amuletos e talismãs.
  • Utilização de práticas tradicionais de cura, em caso de problemas de saúde.
  • Procura por curandeiros e feiticeiros.

Oralidade

Um aspecto fundamental da cultura tradicional africana é a oralidade. As crenças, os rituais, os costumes, a sabedoria ancestral – tudo isso sempre foi transmitido de geração para geração através da linguagem oral. A tradição oral permitiu com que africanos de muitas gerações aprendessem desde técnicas agrícolas a rituais religiosos.

Sobre esse tema, importante mencionar a figura dos griots, pessoas que cumprem a função de transmitir a tradição através da fala. Os griots são guardiões da memória na África Ocidental. Além de excelentes oradores e contadores de histórias, os griots também tocam instrumentos e cantam, à semelhança dos poetas trovadores.

Já que estamos falando de um continente tão vasto e diverso, mencionaremos, a título de exemplo, apenas algumas tradições de grupos étnicos africanos:

Ritual wodaabe

Um dos rituais mais interessantes é uma espécie de concurso de beleza masculino praticado pelos wodaabe, grupo étnico nômade que vive na região centro-oeste do continente. Durante as reuniões tribais, os jovens se enfeitam e são julgados por mulheres de outra linhagem.

ritual wodaabe

Homens da etnia wodaabe cantam e dançam durante festival no Niger.

O penteado das mulheres himba

As mulheres himba, etnia seminômade do noroeste da Namíbia, cultivam um penteado a base de um creme (otjize) composto por gordura, pasta de manteiga e ocre vermelho (que é um pigmento da terra). O ritual estético, que também inclui a pele, é reproduzido todas as manhãs.

mulher himba

Mulher da etnia himba, da Namíbia.

O véu dos tuareg

Dentre os tuareg, grupo nômade que habita a região do Sahel e o deserto do Saara, são os homens que vestem véu e turbante. Esses longos panos azuis servem para proteger do sol e da areia e são vistos como símbolo de masculinidade.

tuaregs do Mali

Três homens tuareg reunidos no deserto do Saara.

Ritual de beleza das mulheres mursi

Um dos rituais de beleza das mulheres mursi, etnia que vive no vale do rio O’mo, na Etiópia, é a aplicação de um disco no lábio inferior, que pode medir vários centímetros. O ornamento faz lembrar os botoques, dos índios da etnia brasileira caiapó.

mulher mursi

Mulher mursi exibe seu enorme disco labial.

Leia sobre o Significado de Etnia.

Elementos da cultura africana

Idioma

Um elemento central de qualquer cultura é a sua língua. É ela que carrega a identidade de um povo e através dela são transmitidos seus saberes e valores. Porém, durante o processo de colonização, tanto os valores tradicionais como as línguas faladas pelos povos locais estiveram ameaçados.

Iniciado no século XIX, o neocolonialismo teve profundos impactos nas culturas dos povos africanos. A exploração das riquezas e da mão de obra veio acompanhada da imposição do modo de vida e das ideias ocidentais, consideradas pelos dirigentes coloniais como “civilizadas” ou “mais evoluídas”.

Mas a imposição do idioma do colonizador não exterminou as línguas tradicionais africanas. Hoje, na África, existem mais de 2.000 idiomas diferentes. Alguns deles, aliás, são produto da troca linguística com árabes, orientais e europeus.

Impossível falar de cultura sem falar de troca. E a troca é o que caracteriza os idiomas euro-africanos, como os crioulos e os pidgins, falados em países como Camarões, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Esses idiomas não são considerados naturais, já que resultam da mistura de línguas tradicionais com europeias.

O idioma mais falado no continente africano é o árabe, com 170 milhões de falantes, depois o inglês, com 130 milhões de falantes. Em terceiro lugar vem o suaíli, idioma falado por 100 milhões de pessoas em países como Ruanda, Quênia, Tanzânia e República Democrática do Congo.

Artes

Em relação às artes, é difícil apresentar de forma breve um panorama da arte africana. Mais uma vez, o que prevalece é a diversidade, seja na arte popular, tradicional ou acadêmica.

A arte tradicional ainda é muito forte na África. Pinturas em cerâmica e cabaça, a escultura e a pintura de temas tradicionais são importantes expressões artísticas dos africanos.

São famosas as máscaras africanas, muitas delas expostas em museus ao redor do mundo. Algumas delas têm função religiosa e festiva. Um exemplos são as máscaras geledé, usadas por homens iorubá em rituais de dança.

Leia mais sobre Máscaras Africanas.

Outro item bastante conhecido das artes africanas são os tecidos, que caíram no gosto de muitas pessoas de outras culturas ao redor mundo. Famosos por suas cores vibrantes e pela diversidade de estilos, os tecidos africanos comunicam, entre outras coisas, a identidade cultural da pessoa que o utiliza.

mulheres nigerianas

Mulheres nigerianas usando seus tecidos de cores vibrantes.

Cultura afro-brasileira

A cultura africana é uma das matrizes culturais do Brasil. Isso se deve ao comércio secular de pessoas escravizadas, que começaram a chegar ao Brasil no século XVI. Ao longo de todo o período da escravidão, quase 5 milhões de pessoas saídas da África chegaram a Brasil.

Com elas, veio sua cultura, dando origem ao que chamamos de cultura afro-brasileira, isto é, um conjunto de valores, crenças e modos de agir influenciados pelas culturas que vieram da África.

Uma das manifestações mais evidentes da presença da cultura africana no Brasil é a música popular brasileira. O samba, ritmo genuinamente nacional, é fruto da cultura africana. Os blocos de afoxé que desfilam pelas ruas de Salvador, na Bahia, durante o Carnaval são outra manifestação importante da cultura africana no Brasil. O maracatu e a capoeira também são expressões culturais cuja origem se deve a influências africanas.

Na culinária, essa influência pode ser notada no uso de temperos e ingredientes (como o dendê) e em receitas típicas, como o acarajé, o vatapá e o angu.

Outra contribuição importante da cultura africana na formação da cultura brasileira é a religião. O candomblé e a umbanda são religiões que surgiram no Brasil a partir de influências das tradições religiosas africanas.

Alguns orixás, divindades de origem iorubá, são cultuados até por adeptos de outras religiões e tornaram-se verdadeiros símbolos nacionais. O caso mais emblemático é Iemanjá, orixá das águas salgadas e rainha do mar, cujo culto é bastante popular em todo litoral brasileiro.

Leia mais sobre a Cultura Afro-Brasileira e a Cultura Indígena.

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Gessica Borges
Review científica by Gessica Borges
Comunicadora, redatora, curiosa de berço e apaixonada por cultura em geral. Licenciada em Comunicação Social pela Universidade Anhembi Morumbi em 2012. Mestre em Estudos Africanos.
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