Racismo estrutural: conceito, exemplos e como é no Brasil

Thiago Souza
Revisão por Thiago Souza
Professor de Sociologia, Filosofia e História

Racismo estrutural é a discriminação racial sistemática presente nas estruturais sociais. Ou seja, é o racismo enraizado na sociedade, que acaba estando presente em todas as instâncias sociais, sejam institucionais, políticas ou econômicas.

Trata-se do tipo de racismo que já faz parte da cultura de um povo e contribui para a perpetuação de desigualdades.

O racismo estrutural no Brasil tem origem no processo de colonização e escravização da população indígena e africana a partir do século XV.

Conceito de racismo estrutural

O racismo estrutural ocorre quando a discriminação racial é um dos elementos que compõe a organização política e econômica de uma sociedade. É assim chamado porque está presente nas estruturas das instituições.

A definição desse tipo de racismo diz que se trata de um conjunto de práticas discriminatórias, sejam culturais, institucionais, econômicas, ou outras, que beneficiam um grupo, causando prejuízo a outro.

Pode-se dizer que todo o racismo é estrutural. Pois, para existir racismo em uma sociedade é necessário que haja uma produção e disseminação constantes de preconceitos, assim como discriminação sistemática.

O racismo estrutural fornece a matéria-prima necessária para reprodução e manutenção de desigualdades e violências.

Está tão presente no tecido social, integrante da história e da cultura, que na maioria das vezes é normalizado, e passa quase a ser invisível para as pessoas que não fazem parte dos grupos vitimizados.

Para enxergar o racismo estrutural é importante observar as desigualdades raciais de uma sociedade.

É através dessas informações e conhecimento que o racismo se torna evidente, possibilitando a implementação de medidas e políticas públicas para combatê-lo.

Exemplos de racismo estrutural

Falta de representatividade política

A estrutura de poder do Estado brasileiro evidencia o racismo estrutural. Apesar de mais de 50% da população brasileira se autodeclarar negra, a maioria dos parlamentares no Congresso Nacional são pessoas brancas.

Nas eleições de 2022, dos 513 deputados eleitos, somente 135 são negros e 5 indígenas.

Falta de representatividade na mídia

Quando se observa a mídia brasileira, nota-se a pouca representatividade de negros e indígenas em funções como a de apresentadores de programas de televisão, nos elencos de filmes e novelas.

Um exemplo que chamou mais atenção foi o da novela "Segundo Sol", de 2018. A trama se passava em Salvador, na Bahia, mas quase todo o elenco era branco.

Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2017, 85% da população de Salvador é negra.

A União de Negros pela Igualdade entrou com uma ação contra a emissora, alegando que o elenco não representava a população daquela cidade.

Falta de representatividade na liderança de empresas

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2019, menos de 30% dos cargos de liderança nas empresas brasileiras são ocupados por pessoas negras.

Baixo percentual de formação universitária

Apesar de ser maioria entre a população brasileira, os negros ainda são menos presentes na formação universitária.

Segundo dados do IBGE, de 2019, entre os universitários, os negros são 38,15% dos matriculados. Esse número é um dos mais altos da história, devido a políticas reparativas, como a das cotas.

A população indígena, que também teve seu acesso à educação negligenciado, ainda tem dificuldades para ingressar no ensino superior.

Entretanto, também tem conseguido alcançar números mais relevantes com as cotas.

Violência urbana

Conforme o Atlas da Violência 2021, no Brasil, a população negra representa 77% das vítimas de homicídio.

Pessoas negras têm mais do dobro da chance de serem mortas em contexto de violência, do que pessoas brancas.

Enquanto a taxa de homicídios por 100 mil habitantes é de 29,2% para a população negras, para o restante da população o número cai para 11,2%.

Palavras racistas na língua portuguesa

O racismo também é refletido nos aspectos culturais e linguísticos, como expressões e palavras com base discriminatórias que se difundiram com os anos. Alguns exemplos são palavras que se utilizam do termo “negro” para referir-se a algo negativo ou que têm origem nos ideais escravagistas, como:

  • Denegrir;
  • Lista negra;
  • Mercado negro;
  • Mulato: sua origem, da língua espanhola, refere-se ao cruzamento entre um cavalo e uma mula;
  • "Meia tigela": tem origem nos negros escravizados que não conseguiam alcançar objetivos de trabalho e só recebiam meia tigela de comida;
  • Macumba: termo pejorativo para religiões de matriz africana, que na verdade remete a um instrumento utilizado em ritos de religiões afro.

Racismo estrutural no Brasil

A condição estruturante do racismo no Brasil é antiga, começou durante a formação do país enquanto nação.

Sendo uma sociedade exploradora e escravagista, a sociedade e a cultura brasileira foram construídas em cima de valores racistas. Negligenciando especialmente as populações negras e indígenas.

Como consequência do racismo estrutural, está a manutenção e intensificação da exclusão, da falta de oportunidades, violência e pobreza para negros e indígenas.

O racismo estrutural começou com a colonização

No século XV, os colonizadores portugueses chegaram ao Brasil e iniciaram a exploração do lugar. Os primeiros a serem vítimas desse processo foram os indígenas, que tiveram a sua cultura desvalorizada, foram escravizados e mortos.

A partir de 1550, os colonizadores trouxeram cerca de 5 milhões de pessoas negras do continente africano para serem escravizadas nas terras dominadas.

A escravidão durou até 1888 e ao longo desse período a população escravizada esteve submetida a um regime bárbaro de violências e trabalhos forçados.

Atualmente, o racismo estrutural age contra os considerados não-brancos: negros, indígenas e outras minorias étnicas.

O fim da escravidão não acabou com a exclusão social dos negros

Mesmo com o fim da escravidão, em 1888, a população negra não teve o direito de integrar a sociedade brasileira.

Estes permaneceram sem acesso à terra, educação ou trabalho.

Um exemplo do racismo da época foi o 2º Ato Oficial de Lei Complementar à Constituição de 1824, que proibia os negros de frequentarem escolas, pois eram “doentes de moléstias contagiosas”.

A falta de oportunidades para os negros durou décadas após a libertação, que levou com que essa população vivesse marginalizada nas periferias das grandes cidades, com péssima qualidade de vida e trabalhando em atividades braçais mal remuneradas.

Teorias raciais justificavam a manutenção do racismo

A partir do século XVIII, teorias pseudocientíficas disseminavam informações falsas sobre uma suposta hierarquização de raças humanas, na qual existiriam raças inferiores a outras.

Essas teorias se difundiram entre os intelectuais brasileiros a partir do século XIX e davam justificativa para manter a marginalização dos indígenas e negros na sociedade mesmo após o final da escravidão.

A imigração europeia e a tentativa de "embranquecimento" da população

Após o fim da escravidão, foram criadas leis para incentivar a vinda de trabalhadores europeus para o Brasil.

Esses incentivos foram mecanismos para tentar promover o "embranquecimento" da população brasileira, com oferta de privilégios aos imigrantes.

O Decreto n° 528 de 1890 abria os portões do Brasil para a imigração, com exceção de “indígenas da Ásia e da África”.

Muitos imigrantes europeus (italianos, alemães, poloneses, entre outros) receberam do Estado brasileiro terras e benefícios para se estabelecerem no país. Os negros, que já estavam em território brasileiro, não receberam tais privilégios.

O racismo ainda intensifica as desigualdades sociais

Mais de três séculos de exclusão permitiram que as estruturas de funcionamento da sociedade brasileira promovessem a continuidade do racismo e a manutenção da população negra e indígena nas margens da sociedade.

Como consequência desses anos, as populações negra e indígena apresentam mais dificuldade no acesso ao mercado de trabalho qualificado, oportunidades de estudo e melhoria da qualidade de vida (como obtenção de saúde de qualidade, segurança e saneamento básico).

Além desses fatores, ainda existem questões discriminatórias direcionadas a cultura de origem africana e indígena.

Como a antiga criminalização do samba e da capoeira, o atual preconceito sofrido pelo funk, pelas religiões de matriz africana e pelas tradições indígenas.

Entenda o que é racismo.

Diferença entre Racismo Individual, Institucional e Estrutural

O racismo tem classificações diferentes, conforme a maneira com que acontece. Os principais tipos de racismo são:

  • Racismo individual: se refere a atitudes de discriminação e preconceitos raciais praticadas por indivíduos contra indivíduos.
  • Racismo institucional: acontece quando as instituições públicas ou privadas agem de maneira racista, concedendo privilégios a determinados grupos sociais e desvantagens para outros.
  • Racismo estrutural: acontece quando a discriminação racial é normalizada e faz parte das estruturas da sociedade, nas relações sociais, econômicas, culturais e políticas. Nesses casos, mesmo que pessoas ou instituições sejam punidas por atos racistas, a responsabilização não reduz as desigualdades.

Por essa razão, especialistas em estudos raciais defendem que a construção de uma sociedade menos desigual só será possível com o fim do racismo estrutural.

Causas do racismo

O racismo é um fenômeno complexo e multifacetado. Como visto, as suas causas são resultado de uma combinação de fatores históricos, sociais e também psicológicos.

No Brasil, o racismo tem sua origem no colonialismo e no sistema escravocrata que foi legalizado até 1888.

Teorias pseudocientíficas que justificavam e incentivavam o racismo também estão entre as causas do fenômeno.

Além do trabalho forçado e do processo de coisificação que as pessoas negras foram submetidas durante o período da escravidão, na qual suas dignidades enquanto pessoas humanas foram negadas.

Houve também a criação de um imaginário social racista que (embora mais enfraquecido, ainda se mantém na atualidade) associava pessoas negras à criminalidade, pobreza, falta de beleza e inferioridade.

Já as pessoas brancas eram sempre dignas de virtude, beleza e compaixão.

Todos esses aspectos são elementos causadores do racismo na sociedade brasileira,e em outras partes do mundo.

Consequências no racismo

As consequências do racismo são muitas e diversas para a sociedade em geral, mas especialmente para as pessoas vítimas do crime, que veem seus direitos e sua humanidade questionados.

As principais consequências do racismo no Brasil são:

  • Danos psicológicos para as pessoas negras, indígenas e outros grupos étnicos que sejam vítima diretas ou indiretas do racismo;
  • Violência: as vítimas de racismo são violentadas por pessoas intolerantes todos os dias, seja verbal, física, sexual ou psicologicamente;
  • Discriminação e exclusão social: o racismo cria uma fronteira invisível, dificultando o acesso de pessoas não brancas a diversos tipos de espaços de poder;
  • Desigualdade econômica e social, o racismo também é um mecanismo de manutenção de pessoas negras e indígenas na pobreza, impedindo-as de ascender socialmente.

Veja também:

Fontes bibliográficas:

ALMEIDA, S. Racismo estrutural. São Paulo: Editora Jandaíra, 2019.

RIBEIRO, D. Pequeno manual antirracista. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

Thiago Souza
Revisão por Thiago Souza
Graduado em História e Especialista em Ensino de Sociologia pela Universidade Estadual de Londrina. Ministra aulas de História, Filosofia e Sociologia desde 2018 para turmas do Fundamental II e Ensino Médio.
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