Texto narrativo

Carlos Neto
Carlos Neto
Cientista Social

O texto narrativo é aquele em que se conta uma história, seja ela real ou fictícia. Seus elementos básicos são espaço, tempo e personagem. Outra característica importante da narrativa é a presença de uma voz que conta a história: o narrador.

O romance, o conto, a crônica e a fábula são exemplos de gêneros narrativos. Todos eles apresentam personagens que agem num determinado espaço e num determinado tempo.

Estrutura do texto narrativo

Tradicionalmente, a narrativa segue uma estrutura linear com começo, meio e fim. Vejamos quais são as partes do texto narrativo:

Apresentação

A apresentação ou situação inicial geralmente é um momento do texto em que o leitor é apresentado à personagem principal (protagonista), que age dentro de um determinado tempo e um determinado espaço.

Desenvolvimento

O desenvolvimento se inicia com a introdução de um elemento que altera a situação inicial. Esse elemento recebe o nome de conflito.

Esta costuma ser a maior parte de um texto narrativo, já que é no desenvolvimento em que o autor do texto irá explorar todas as consequências que o conflito terá na vida das personagens envolvidas na história.

O momento mais dramático do conflito, quando a tensão chega ao seu nível mais elevado, recebe o nome de clímax.

Desfecho

Após o clímax, a história caminha para o seu final. O desfecho ou desenlace é a parte do texto em que o leitor conhece as consequências das situações narradas. O desfecho é, em grande parte dos casos, a parte do texto em que o conflito se resolve.

Outras estruturas

Na literatura, há muitos exemplos de textos narrativos que não seguem a estrutura descrita acima.

Alguns já começam pelo conflito, sem situação inicial. Outros não são lineares: iniciam pelo desfecho ou por alguma parte do desenvolvimento e depois voltam ao início. Há textos em que, a todo momento, cenas do passado são trazidas para o presente (esse recurso é conhecido como analepse ou flashback).

Enfim: quando se trata da estrutura da narrativa, existem muitas possibilidades de criação.

Tipos de texto narrativo e exemplos

Romance

O romance é um relato extenso de uma série de situações de conflito envolvendo mais de uma personagem. Caracteriza-se por uma tentativa de criar um universo imaginário em que se exploram questões sociais, políticas ou psicológicas. São exemplos de romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado, e A Hora da Estrela, de Clarice Lispector.

Exemplo de romance:

Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da Lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos. A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus. Sucedeu, porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.
— Continue, disse eu acordando.
— Já acabei, murmurou ele.
— São muito bonitos. Vi-lhe fazer um gesto para tirá-los outra vez do bolso, mas não passou do gesto; estava amuado. No dia seguinte entrou a dizer de mim nomes feios, e acabou alcunhando-me Dom Casmurro.

Trecho do Capítulo Primeiro do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis

Conto

O conto é uma narrativa breve, concisa, geralmente organizada em torno de algum episódio da vida da personagem. Diferentemente do romance, o conto se limita a explorar um único conflito. Exemplos de conto são “O peru de Natal”, de Mário de Andrade, “O homem que sabia javanês”, de Lima Barreto, e “Antes do baile verde”, de Lygia Fagundes Telles.

Exemplo de conto:

Era costume sempre, na família, a ceia de Natal. Ceia reles, já se imagina: ceia tipo meu pai, castanhas, figos, passas, depois da Missa do Galo. Empanturrados de amêndoas e nozes (quanto discutimos os três manos por causa dos quebra-nozes...), empanturrados de castanhas e monotonias, a gente se abraçava e ia pra cama. Foi lembrando isso que arrebentei com uma das minhas "loucuras":
— Bom, no Natal, quero comer peru.
Houve um desses espantos que ninguém não imagina. Logo minha tia solteirona e santa, que morava conosco, advertiu que não podíamos convidar ninguém por causa do luto.
— Mas quem falou de convidar ninguém! essa mania... Quando é que a gente já comeu peru em nossa vida! Peru aqui em casa é prato de festa, vem toda essa parentada do diabo...
— Meu filho, não fale assim...
— Pois falo, pronto!

Trecho do conto “O peru de Natal”, de Mário de Andrade

Veja outros Exemplos de Conto.

Crônica

A crônica é um texto curto, geralmente publicado em jornais, revistas e blogs. É quase sempre narrada em primeira pessoa e aborda, em linguagem coloquial, algum tema do cotidiano. São exemplos de crônica “A última crônica”, de Fernando Sabino, “O solitário”, de Rachel de Queiroz, e “O Conde e o passarinho”, de Rubem Braga.

Exemplo de crônica:

A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade estou adiando o momento de escrever. A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito mais um ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência, que a faz mais digna de ser vivida. Visava ao circunstancial, ao episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina, quer nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador e perco a noção do essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o verso do poeta se repete na lembrança: “assim eu quereria o meu último poema”. Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último olhar fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.

Trecho de “A última crônica”, de Fernando Sabino

Fábula

A fábula é um tipo de texto, em prosa ou em verso, que se distingue de outros gêneros narrativos pela presença de animais ou mesmo seres inanimados como personagens. Outra característica da fábula é o conteúdo de caráter moral que a história transmite. São exemplos de fábulas “A Águia e a Coruja”, de Monteiro Lobato, “A Raposa e as uvas” e “A Lebre e a Tartaruga”, de Esopo.

Exemplo de fábula:

Coruja e Águia, depois de muita briga, resolveram fazer as pazes.
— Basta de guerra – disse a coruja. – O mundo é tão grande, e tolice maior que o mundo é andarmos a comer os filhotes uma da outra.
— Perfeitamente — respondeu a Águia. — Também eu não quero outra coisa.
— Nesse caso combinemos isto: de ora em diante não comerás nunca os meus filhotes.
— Muito bem. Mas como posso distinguir os teus filhotes?
— Coisa fácil. Sempre que encontrares uns borrachos lindos, bem feitinhos de corpo, alegres, cheios de uma graça especial que não existe em nenhum outro filhote de nenhuma outra ave, já sabes, são os meus.
— Está feito! – concluiu a Águia.
Dias depois, andando a caça, a Águia encontrou um ninho com três monstrengos dentro, que piavam de bico muito aberto.
— Horríveis bichos! — disse ela. – Vê-se logo que não são os filhos da coruja.
E comeu-os.
Mas eram os filhos da coruja. Ao regressar à toca a triste mãe chorou amargamente o desastre e foi justar contas com a rainha das aves.
— Quê? — disse esta, admirada. – Eram teus filhos aqueles monstrenguinhos? Pois olha, não se pareciam nada com o retrato que deles me fizeste...
Para retrato de filho ninguém acredite em pintor pai. Lá diz o ditado: quem o feio ama, bonito lhe parece.

Fábula “A Águia e a Coruja”, de Monteiro Lobato

Tipos de narrador

O narrador é quem conta a história. Não se pode confundi-lo com o autor, que é quem escreveu o texto. O narrador, portanto, é uma entidade fictícia. Muitos estudiosos já se debruçaram sobre o tema, de modo que há diversas classificações de narrador. Vejamos os tipos de narrador mais conhecidos:

Narrador personagem

Este tipo de narrador participa diretamente da ação enquanto personagem. O narrador pode ser a personagem principal da história (autodiegético) ou personagem secundário (homodiegético). Como participa da história, o narrador geralmente usa a 1ª pessoa.

Em “A última crônica”, de Fernando Sabino, podemos notar, logo na primeira frase, que quem narra a história é uma personagem: “A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão.”

Narrador observador

Não participando da história, este tipo de narrador relata os acontecimentos em 3ª pessoa como um observador. É também chamado de narrador heterodiegético. Um exemplo desse tipo de narrador encontramos na fábula “A Águia e a Coruja”, de Monteiro Lobato.

Dá-se o nome de narrador onisciente ao narrador que sabe tudo o que se passa, inclusive dentro da cabeça das personagens. O narrador onisciente pode ser intruso (aquele que chega a tecer comentários e juízos de valor) ou neutro (que não faz comentários e narra os acontecimentos de forma mais objetiva).

Veja também:

Carlos Neto
Carlos Neto
Formado em Ciências Sociais (FFLCH-USP), Carlos é mestre em Estudos Portugueses, com especialização em Literatura Portuguesa Contemporânea. É escritor e dá aulas de Redação e Sociologia na Educação Básica desde 2007.
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